Oitava capítulo
Bicicleta maluca – só de me
lembrar começo a rir
Teve uma época que o Ronan, filho
do Hilário, lembra? Pois é, ele ganhou sua primeira bicicleta. Ele podia, o pai
era fazendeiro, catireiro e tinha até um jeepe. Contudo ele não sabia andar e
lá ao redor de casa tinha um lugar bão pra cair. Era um campo velho de futebol
e uma estrada larga de terra macia. Era a conta dele montar e tibuf - caía. Eu
era seu ajudante. Ele montava eu empurrava ele caia. Foi assim até que ele
pegou o primeiro equilíbrio saiu pedalando feito um doido e quando quis não
sabia parar e então a valeta da estrada fez isso pra ele. Depois de bem sujo e
esfolado, finalmente me deixou tomar uns dois ou três tombos. E ainda tem gente
que pensa que o causo do Geraldinho com a tal da bicicleta era invenção! Mas
era bonita aquela danada, viu? Toda colorida... cheia de rodas bonitas – só
duas né? Bem, é preciso dar um desconto por ficar tão impressionado, afinal foi
a primeira que vi e toquei! Mas que era bonita era! Por isso que meu sonho era comprar uma bicicleta
e um carro de bois cantando, cortando as estradas e aqueles bois todos
aparelhados... e eu gritando: vamos malhado, vamos rochão, vamos... passou a
vontade, agora eu queria mesmo é uma Ferrari, uma..., uma.....deixa prá lá
também, tô até bem montado, pra quem não tinha uma bicicleta! Obrigado meu
Deus, Você é cabra bão e nunca me deixou quieto. Quase me mata de tanto
trabalhar e estudar, mas continua bão comigo. Não se preocupem com meus modos,
Ele me conhece melhor que todos e sabe bem do que falo e do quanto lhe credito
meus humildes sucessos.
Descuido
Minha mãe às vezes cometia seus
descuidos. Um dia saímos de casa com destino a casa dos monteiros, que eu
chamava de tios por afinidade a minha tia Antônia, mãe do João Alves, lembra? Para chegar lá se passava na porta da fazenda
do famoso Hilário e em seguida um pequeno riacho que descia exatamente lá dos
Monteiros (família monteiro que moravam meio reunidos, como num quilombo. Este
pequeno riacho desagua no rio Carrapato. Acontece que quando o rio carrapato se
enchia represava o riacho e este mesmo com a água limpinha se tornava cheio e
profundo. Não sei se porque estava um pouco escuro, minha mãe foi chegando e
mandando ver, puxando-me pela mão. Quando ela viu, estava com a água no pescoço
e me levantando pra cima da cabeça. Menino foi um sufoco e só não foi drástico
porque a água estava parada, sem força e o riacho era estreito! Dois ou três
pulos e lá estávamos do outro lado do riacho! Olha, já estava meio escuro e não
sei se vi muito bem, mas acho que minha mãe estava meio branca e sua respiração
bem ofegante quando chegamos do outro lado. È meu filho minha mãe era durona e
não dava muito “o braço a torcer” mas ela passou medo e claro, mais por minha
causa. Ôh mãe! Que saudades!.
Êta carne dura
Meu tio Pedro Salvino era um
homem metido a valente e me parece que já foi daqueles delegados nomeados que
buscava o caboclo amarrado no rabo do cavalo. Logo, era valente mesmo, né? O
que de fato sei é que ele não largava de uma espingarda de duas bocas. Ele
sumia e de vez em quando aparecia por ali e minha mãe parecia ter muita cautela
com ele, embora sempre brava. As vezes ele chegava com um cabrito, pendurava na
entrada da sala e alí tirava o couro do bicho. Certa vez ele apareceu com nada
e ouvindo as seriemas cantarem no alto da serra disse: Pedro, vamos ali buscar
uma galinha daquelas. Não, o Pedro não vai,
interviu minha mãe. Deixa de bobagem Sinhana, eu cuido do menino, disse ele! E
pronto, lá fui eu com ele enquanto minha mãe ficava num pé e noutro. Acho que a
razão da cisma de minha mãe é porque
certo dia ele disse: menino cê cala a boca senão eu ...., - não me
lembro bem qual foi a palavra ameaçadora, mas assustou – a ela e a mim,
claro. Besteira, né? Mas desde então
minha mãe ficou com “a pulga atrás da orelha”.
Pois bem, lá fomos nós seguindo o canto das siriemas e depois de subir
um grande morro e ir descendo doutro lado, só ouvi os tiros: foram dois e lá
estavam as duas “galinhas” estendidas. Voltamos
com as duas galinhas conforme ele, mas acho que só tomamos o caldo porque ficou
o dia inteiro na panela cozinhando!
Noutra oportunidade o mesmo tio
Pedro me chamou para pescar no rio Carrapato. Para quem não sabe, ou não se
lembra, o rio tinha muita água e a gente não o atravessava em qualquer ponto e
sim nos locais onde era mais raso e abria no barranco locais para o gado beber
água e estes locais se chamavam de “aguadas”. Na época não conhecia outros rios
senão ele, o Carranca e os córregos vizinhos. Todavia o que posso dizer é que
este rio tinha uma enorme quantidade e variedade de peixes. É como dizia o
ditado “coloque a gordura na panela que vou buscar o peixe”. Eram tantos e
famintos que não havia erro: um simples minhoca ou qualquer coisa parecida e lá
vinha ele fisgado. Outros como meu tio, preferia pegar no tiro: ficava no
barranco, pedra ou galho do pau e escolhia no poço o peixe que queria. Era só
um tiro, o peixe prancheava e era levado para casa. Naquele tempo não havia o
espírito de destruição de hoje. Você pescava só o bastante para comer naquele
dia pois não havia geladeiras e ninguém gostava de salgar e conservar a título
de estoque. Às vezes se fazia, mas pela preferência de como iria ser consumido.
Como ninguém matava mais do que precisava para o consumo mais imediato, nunca
faltava peixe. De igual modo o povo não desmatava todas as margens dos rios e
por isso não havia assoreamento e consequente sumiço da água. Meu Deus como
esse rio faz falta. Hoje é um córrego e ainda vem bravamente se sustentando
entre pequenos poços e o que é mais incrível, ainda se encontra peixes, mesmo
com a constante pesca destrutiva : redes, arpão e no passado até bombas.
Mas voltemos a minha pequena
pescaria: meu tio com sua velha espingarda de dois canos e eu com minha velha
varinha de bambu e algumas minhocas arrancadas perto do chiqueiro. Meu tio me
colocou logo em cima de uma grande pedra e disse: não saia daqui e quando pegar
o peixe me chame. Minutos depois escutei
o tiro noutro poço lá na volta do rio e depois o silêncio. Daquele silêncio fui
arrancado por um forte puxão na linha e no susto fisguei o peixe. A varinha
começou a entortar e eu fu deslizando e disse comigo mesmo: você não vai embora
peixe e não soltei a vara. Mas ele foi: levando eu e a vara até que eu
tibummm... caí no poço e me debatendo para não afogar e a vara não soltava, até
que... ufa, alguém me pegou pelo colarinho da camisa (era de algodão tecido no
teal caipira meu – não rasgava e nem soltava a cor igual a propaganda da ...)
Era meu Santo tio que dizia: fica duro caboclo! E lá fomos nós para a praia:
eu, minha varinha, o peixe fisgado e meu tio puxando todo mundo. QUE FARRA MEU!
QUE BAITA DE DOURADO! Não, não vou contar o tamanho senão vocês vão dizer que é
mentira de pescador, igual a estória da onça que vou contar lá na frente, no
ano de 2012. Ah! Você pensa que fui
orgulhoso contar toda a estória do peixe para minha mãe, né? É verdade, mas
houve uma pequena mudança na narração: a
parte que eu estava sozinho e cai da pedra ela nunca soube. Não é que eu
gostava de mentir sabe? Acontece que eu gostava de pescar e se minha mãe
soubesse disso, Adeus pescaria com meu tio, pois para ela, ele seria um
“irresponsável, um..., um ....”
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