Capítulo 11
Pedro em Patos de Minas – Pensão
Minas
O padrinho Antônio Bento, comprava
arroz em casca e feijão, milho, galinhas, qualquer coisa e levava no tal
caminhão para vender na cidade vizinha (100 km). Era uma cidade muito maior e
vendia tudo num belo mercado que existe lá até hoje. Se entusiasmou e resolveu
mudar de ares. Até hoje não sei se ele
comprou ou alugou uma pensão, ao lado da
antiga rodoviária, a qual se chamava Pensão Minas. As mulheres, minha mãe e minha irmã tocavam a
pensão e ele, que não tinha carteira de motorista contratou um chofer (motorista)
e buscava coisas e vendia. As vezes levava mercadorias para as cidades de Curvelo, Gouvêia e outras e de lá trazia
bebidas como a pinga Tatuzinho, muito famosa na época. E nós, resolvemos montar um caixa de engraxar
e partimos para a luta.
O soldado Rafael -- Teje Preso
Mas logo assim nos primeiros
dias, eu estava mais perdido que cego em tiroteio. Não tinha ainda amigos, não sabia o que fazer
e então sai por ali, curioso com a praça bonita bem pertinho, onde me sentei
num daqueles bancos de cimento cheio de propaganda e fiquei assistindo os
moleques brincarem. Eram espertos, mas eu muito tímido, nem dava para conversar
ainda. Moleques atentados subiam nas árvores apanhavam umas frutinhas verdes e
duras e através de um canudinho guerreavam
soprando as frutas uns nos outros e nas pessoas que passavam. De repente todos saíram
disparados, dizendo o “cana” ta vindo, corram! Besta de
tudo não entendia nada do
que acontecei e ali fiquei olhando para
um lado e outro feito besta, quando encostou um PM usando aquele capacete que mal dá pra ver o
rosto e disse: Você estava trepando nas árvores e quebrando as galhas, não é? –
Não senhor, foram eles... cadê, sumiram!!! – Você está preso, me acompanhe. –
Mas senhor! – Calado, vou te levar para a cadeia. Quase me mijei todo de medo! Eu não conhecia
soldado, só ouvia dizer e agora, aquele homem todo fardado me dizendo que eu ia
pra cadeia. Cadeia não era muito horrível, eu já tinha ouvido falar e escutava
as música, por exemplo – meu ipê florido, junto a minha cela, ... Meu Deus eu nunca vou sair de lá? E fui andando na frente do PM. Tremia feito vara verde e minhas pernas
eu nem sentia mais. Estava no ar. E pensava:
agora, o que fazer? Vou preso e ainda vou apanhar. Meu Deus, não deixa
não! Por favor... – Ei garoto, estou
falando com você, ta ouvindo não? – Sim senhor! Onde você mora? Bem... Eu e o
soldado passavamos bem em frente a pensão. Mas se dissesse, ele
contaria para minha mãe. E para o padrinho? Nossa, melhor não falar. – Garoto,
responde logo! É que, que... eu não sei...
– Hi, já sei que vou ter que chamar o jipão mesmo. – Como? – Jipão é o
carro da polícia aqui, você não sabe? – Não senhor, eu mudei pra cá ontem!
Hamm... você está perdido? – Não senhor... - Pode falar garoto, você é muito
caipira e sei que não foi você. Que
alívio! Respirei profundamente apontei o dedo e disse: eu moro ali. E pensei : “mardito”, eu já tava me
mijando! - Pode ir pra casa, disse ele,
mas cuidado pra não se misturar com estes pestinhas daqui viu? Vou estar sempre
aqui vigiando, tá me ouvindo? – Sim senhor, tou indo, não vou me misturar... e
fui... Com o tempo soube que o meu carrasco se
chamava Rafael e era bem conhecido por alí.
Mas você já viu o que faz um vira-lata na rua, quando alguém solta
foguete? Pois é, eu também saí feito uma
bala e fui parar debaixo da cama e de casa não saiu o resto da semana. Ah soldado!....
Os engraxates
Como disse logo atrás, nós
crianças da casa, fomos ficando mais mansos com a polícia e tudo mais e
começamos a engraxar na porta da pensão e quando o movimento ficava meio fraco
a gente ia engraxar na pracinha.
Acontece que lá era proibido, mas muitos garotos iam prá lá e quando
chegava a polícia todo mundo corria. Mas nem sempre. De vez em quando chegavam
tão na surdina e quando a gente acordava estava de frente com os soldados que
recolhiam todos os garotos e seus engraxates, enfiavam tudo dentro do tal jipão
e levava para a cadeia pública, só saindo de lá quando os pais comparecessem e
após pagar aquele sapo. Aí, como sempre a gente levava uma surra em casa e tudo
voltava ao normal.
Por falar em surra, certa vez de
manhã acordou o José e o João e começaram a brigar de travesseiros. Eu reclamei
dizendo que queria dormir e então me incluíram nas travesseiradas. De repente
meu padrinho aparece na porta e a distribuição de correiadas foi geral. Até
aquele dia ele nunca havia me encostado a mão porque era cagão de medo dele e
sempre era o todo obediente. Mas naquele dia ele não desperdiçou a viagem. O
João e o José tratou logo de chorarem escandalosamente e sair correndo para
perto da mãe deles. Mas eu ..., eu não podia acreditar que ele estava me
batendo e então entrei em pânico: em vez de chorar, arregalei os olhos, comecei
a dar soluços, fiquei sem respirar e fui ficando roxo. Notando aquilo ele se
preocupou e tentou conversar comigo, mas as coisas pioravam, ele me levou para
o quarto nº 2 da pensão que estava vazio e comigo no colo mandou que alguém
corresse até a farmácia de frente, contasse como eu estava e trouxesse o
farmacêutico correndo. Eu não sei dizer direito se ele me aplicou uma injeção
ou que ele fez comigo, mas fui acalmando e aos poucos comecei a chorar
baixinho, já que me diziam que eu podia chorar (acho que eu tinha medo de
chorar e ele me bater mais). Olha,
exceto o fato de que a fivela do cinto acertou meu rosto, o meu susto, o meu
medo foi muito maior que a dor física e então eu criei coragem e disse: eu
quero ir embora daqui, eu não fiz nada! Minha mãe é claro, virou um urutu e foi
preciso muita conversa para as coisas se assentarem e meu padrinho é claro,
prometeu e cumpriu: nunca mais me bateu.
Tentou muitos anos depois, mas eu corri e foi por ciúme dele embalado
por umas pinguinhas. Mas isso conto bem na frente quando fiz dezesseis anos.
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